Copa do Mundo bienal

O casamento de conveniência entre futebol e Jogos Olímpicos ainda tem futuro?

Brasil e Alemanha na fase de grupos de Tóquio-2020

Brasil e Alemanha na fase de grupos de Tóquio: torneio masculino de futebol fica esvaziado sem força máxima nas seleções.

Não são apenas a Uefa e a Conmebol que andam atormentadas com a ideia idiota do presidente da Fifa, Gianni Infantino, de realizar a Copa do Mundo a cada dois anos em vez de quatro. O Comitê Olímpico Internacional – do qual Infantino, aliás, é membro – também está de orelha em pé, em boa parte pelos mesmos motivos que enfureceram as entidades europeia e sul-americana: a coincidência de datas, seja com a Copa América, com a Euro ou com os Jogos Olímpicos – no caso europeu, ainda há a oposição dos clubes, sempre relutantes em ceder seus jogadores pagos a peso de ouro para as seleções nacionais.

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O chefão da Fifa jura de pés juntos que a relação não mudaria em nada e que a Fifa não tem a menor intenção de tirar o futebol do programa olímpico. E isso nos leva àquela frase do Fernando Meligeni quando criticou (com toda a razão) Daniel Alves no episódio dos agasalhos boicotados na premiação em Tóquio: o esporte olímpico (do Brasil, mundial, pouco importa) precisa do futebol? E podemos inverter a questão: o futebol precisa dos Jogos Olímpicos?

Convenhamos: o torneio masculino de futebol é bastante esvaziado sem a possibilidade de as grandes seleções mundiais levarem força total – uma escolha da Fifa, que não quer ver o torneio olímpico rivalizando com a Copa do Mundo. Creio que o futebol é o único caso em que o campeonato mundial da modalidade tem muito mais visibilidade que sua versão olímpica, e isso explica que todas as outras federações esportivas concordem em ver os times principais de suas modalidades disputando o ouro. Se o campeonato mundial de basquete tivesse o mesmo prestígio da Copa, por exemplo, será que a Fiba teria liberado um Dream Team em 1992?

As duas megaentidades esportivas continuarão se tolerando até uma delas concluir que não precisa mais da outra para nada

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Então, pensando exclusivamente por este lado, não é que o torneio olímpico de futebol masculino, em seu formato atual, seja algo tão essencial assim. Quando você pensa em ícones da história olímpica, algum jogador de futebol vem à sua mente? Então, eu diria que sim, os Jogos Olímpicos poderiam prescindir do futebol, se não fosse pelo entorno da coisa.

O primeiro complicador seria o torneio de futebol feminino. Ali, sim, as seleções vêm com os times principais, e os Jogos Olímpicos ainda são muito importantes para a modalidade, ainda que a Fifa esteja bastante empenhada em promover a Copa do Mundo de futebol feminino. Duvido muito que a Fifa aceitasse manter apenas o torneio feminino de futebol nos Jogos Olímpicos, ou topasse trocar o torneio masculino de futebol de campo pelo futsal (o que eu, particularmente, acho que seria muito bom); a entidade provavelmente insistiria na “venda casada”.

Depois, há o fato de que, goste ou não o COI, o futebol é o
esporte mais popular do mundo. E como você faz uma competição multidesportiva
sem o esporte mais popular do planeta? Em países mais futebolcêntricos como o
nosso, o fato de haver futebol nos Jogos serve de chamariz para que as pessoas
acabem vendo outras modalidades também? Em outras palavras: há gente que nem
ligaria mais para os Jogos Olímpicos se não houvesse um campeonato de futebol
dentro deles? Não sei se o COI tem algum estudo nesse sentido, e, se não tem, já
deveria estar providenciando.

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No fim das contas, não acho que essa maluquice do Infantino
vá prosperar. Mas, mesmo que a Copa siga ocorrendo apenas a cada quatro anos, a
relação entre Fifa e COI continuará sendo um casamento de conveniência em que
os parceiros não são exatamente apaixonados um pelo outro. Talvez a coisa até
piore um pouco, já que Infantino sabe que Thomas Bach também trabalha contra a
ideia da Copa bienal. As duas megaentidades esportivas continuarão se tolerando
até uma delas concluir que não precisa mais da outra para nada.

A Aiba terá coragem de suspender a Sérvia?

Na coluna passada falei das investigações de Richard McLaren sobre corrupção e manipulação de resultados dentro da Aiba, a federação internacional de boxe amador. Agora a entidade tem outro problema sério para resolver. O campeonato mundial da modalidade está ocorrendo na Sérvia, e os atletas do Kosovo – nação reconhecida pelo COI e por boa parte da comunidade internacional, mas que a Sérvia considera pertencer ao seu território – estão comendo o pão que o diabo amassou. A delegação kosovar teve a entrada recusada no país-sede três vezes e segue esperando a permissão para ir a Belgrado.

A Aiba afirmou, em comunicado, “lamentar” a situação, e disse estar trabalhando para permitir que os kosovares participem da competição, mas sem sucesso até agora. Segundo o site insidethegames, a entidade ainda acrescentou que o acordo que fez da Sérvia o país-sede do mundial previa a liberação para que a delegação do Kosovo estivesse no torneio sem restrição alguma, acordo que os sérvios quebraram.

Se os sérvios não recuarem, a solução é simples: suspender a Sérvia, como a Federação Internacional de Judô fez com o Irã depois do episódio envolvendo Said Mollaei. O COI, que está esperando por melhorias na governança da Aiba, está de olho para ver se a nova gestão da entidade que comanda o boxe amador está disposta a se levar a sério, ou se vai se deixar desmoralizar pela intromissão da política internacional no esporte.

Duas despedidas

Duda Amorim ajudou a colocar o Brasil no mapa do handebol. Destaque do time campeão mundial de 2013 e melhor jogadora do torneio, melhor jogadora do mundo em 2014, tricampeã pan-americana, e isso só para ficar nas conquistas com a seleção brasileira. Isadora Williams ajudou a colocar o Brasil no mapa da patinação no gelo. Estreou nos Jogos Olímpicos em Sochi-2014 e, em PyeongChang-2018, tornou-se a primeira sul-americana a se classificar para o programa longo da patinação artística; não conseguiu a classificação para Pequim-2022 ao competir na última seletiva ainda se recuperando de uma lesão.

As duas anunciaram suas despedidas nos últimos dias: Duda não jogará mais pela seleção, e Isadora deve encerrar a carreira de patinadora no fim deste ano ou, no máximo, após o campeonato mundial no início do ano que vem.

Os fãs do esporte olímpico sentirão falta. É triste que Duda deixe a seleção sem uma medalha olímpica, com duas derrotas doídas em quartas-de-final quando o Brasil estava no auge (volta, Morten!). E queria muito ter visto Isadora patinando em Pequim. Mesmo quem não acompanha patinação artística é capaz de comprovar o quanto ela evoluiu entre 2014 e 2018. Quem sabe aonde ela poderia ir em 2022? Mas sejamos gratos pelo que elas construíram. Que muitas meninas se inspirem nelas e queiram chegar ainda mais longe.

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