O ano de 1970 marcou o primeiro encontro do sobrenome Slimani com o Coritiba.

No dia 5 de dezembro daquele ano, o Coxa derrotou o então campeão nacional, CR Belouizdad, por 2 a 1, em Argel, capital da Argélia, com gols de Leocádio e Rinaldo.

Na equipe africana, figurava entre os titulares o defensor Abderrahmane Slimani, cujo sobrenome era um dos mais populares do país.

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O duelo foi apenas um dos quatro disputados pelo Alviverde em território argelino, parte das excursões internacionais de 1970 e 1972 – esta última renderia ao Coxa a honraria da Fita Azul.

Mais de 50 anos depois, é a vez de outro Slimani percorrer caminho contrário e desembarcar no Alto da Glória: o artilheiro Islam Slimani é a principal contratação alviverde para 2023. Além de gols, a vinda do goleador resgata a exótica relação coxa-branca com a Argélia.

Torcida do Coritiba recebe Slimani. Foto: Átila Alberti/UmDois Esportes

A primeira “excursão argelina”: 1970

O amistoso no país no Norte da África contra o homônimo do reforço alviverde fez parte de uma série de duelos do Coritiba na excursão internacional de 1970.

Naquele ano, o Coxa disputou dez partidas: vitória contra Angers e empate contra Nancy, na França; empates contra Radnicki e Vojvodina, na então Iugoslávia; derrota para o Rapid Bucareste e empate com o Arges, na Romênia; derrota para o Sporting, em Portugal; além dos dois duelos em solo argelino: triunfos sobre a seleção local, além do já citado Belouizdad.

O embate de 3 de dezembro, contra a seleção da Argélia, em um estádio lotado de fanáticos torcedores, terminou com goleada alviverde por 4 a 1: dois gols de Leocádio e outros dois de Dirceu Krüger.

Reinaldinho “desbravou” a Argélia. Foto: Divulgação/Coritiba.

A partida, a primeira de um clube paranaense em solo africano, foi televisionada para Argélia, Marrocos e Tunísia. Já o campo não tinha grama, apenas terra.

“Pouca gente viu, mas em minha opinião, foi o maior gol que o Krüger fez na carreira”, relembra o ex-atacante Reinaldinho. “Foi um golaço, um espetáculo. Com o goleiro saindo, sem ângulo, ele virou o corpo, deu o giro e meteu no ângulo. O estádio aplaudiu”, detalha.

Reinaldinho
relembra a chegada pouco auspiciosa ao país. “Alguns carros foram nos buscar e
nos largaram em um lugar estranho, velho, antigo. E a gente com fome. Aí o
pessoal falou: ‘Aqui a gente não fica’”, relembra.

Coube ao zagueiro Oberdan e ao médico Luiz Roberto Vialle repararem a situação. “Nós estávamos afastados. Eles foram para a beira da estrada e deram um jeito de ir ao centro da cidade. E aí sim nos arrumaram um hotel espetacular”, completa.

A segunda ida: a
excursão de 1972 e a Fita Azul

O Coritiba
voltaria a disputar mais duas partidas na Argélia na série de jogos
internacionais de 1972.

Naquele ano, o Coxa venceu o Fenerbahçe e empatou com seleção da Turquia e Portuguesa, em Istambul; venceu Moulodia e WRS, na Argélia; e bateu a seleção olímpica de Marrocos, completando a turnê invicta, que renderia o título honorífico da Fita Azul.

Após os duelos na capital turca, no entanto, o elenco coxa-branca ficou cinco dias parado em um hotel da cidade, aguardando o próximo destino.

As excursões de 1970 e 72 foram organizadas pelo empresário Elias Zacour, como parte de uma estratégia de campanha do brasileiro João Havelange para angariar votos na eleição para a presidência da Fifa.

Coritiba embarca para a excursão de 1972. Foto: Divulgação/Coritiba

“O interesse do Havelange era abrir o futebol na Ásia, na África, para ele chegar à presidência da Fifa, como chegou, em 1974. E o nosso empresário era muito ligado a ele. Fomos jogar na Europa a pedido deles”, relembra o Capitão Hidalgo, líder da equipe nas viagens de 1972.

O Coxa ganharia o torneio amistoso na Turquia. “Após os jogos na Turquia, ficou uma dúvida. A Portuguesa estava no mesmo hotel que nós, e não sabíamos qual time iria para a Grécia e qual iria para a Argélia”, conta.

“Então Elias Zacour decidiu que a Portuguesa iria jogar na Grécia. E nós em Argel. A gente não sabia o que era a Argélia. Como líder do nosso time, que estava em alta, eu falei: ‘Faz o seguinte, nos leve antes para conhecer Roma, e depois seguimos para lá’”, relembra Hidalgo. Pedido atendido.

Hotel suntuoso, ataque à cozinha e o “drama” de Dreyer

No dia 28 de junho de 1972, o Coxa venceu o Moulodia por 1 a 0, na capital Argel, gol de Hélio Pires. Em 1º de julho, bateu o WRS por 3 a 1, em Setif, com dois de Hélio Pires e um de Cláudio Marques. Os campos de terra ficaram marcados na memória, e no rosto, do volante Dreyer.

“Eu caí de cara no chão e ralei o rosto. O campo parecia de areia”, relembra o argentino. “Mas o país é lindo, paramos em um hotel quase de frente para o mar…”, prossegue.

“Os campos e estradas eram horrorosos, mas o hotel era suntuoso”, reforça Hidalgo. Após o jogo em Setif, aliás, o elenco foi surpreendido no hotel sem o serviço da janta. E tudo após horas de estrada e uma partida de futebol. “Assaltamos a cozinha. Teve gente que comeu pão com ervilha”, brinca o capitão.

“A gente foi na cozinha e se serviu direto das panelas. Umas carnes que a gente não conhecia. Na época, foi uma aventura. O Elias Zacour arrumava os jogos e a gente só ia”, reforça o ex-lateral, Hermes, que disse que, para se garantir, adotou dieta baseada em frutas e pão pita.

“Os campos eram de terra, os jogo à noite, uma poeira impressionante. E não cabia mais nenhuma pessoa nos estádios”, rememora. “E eu me enchia de maçã para me garantir”, finaliza Hermes.

** Os dados das partidas do Coritiba na Argélia foram disponibilizados pelo Grupo Helênicos

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