Futebol
Dia Internacional da Mulher

Elas lutam pela vida e têm em Athletico e Paraná um motivo a mais para persistir

Por
Luana Kaseker
07/03/2021 21:28 - Atualizado: 29/09/2023 20:04
Maria Lúcia e Itauana, prova de amor.
Maria Lúcia e Itauana, prova de amor. | Foto: Arquivo Pessoal

Qual é o tamanho do seu amor por um time de futebol? Para essas duas torcedoras, a paixão por Athletico e por Paraná têm sido um motivo a mais para lutarem pela vida. E elas fazem de tudo, superando cada dificuldade, para acompanhar o clube do coração na Arena da Baixada ou na Vila Capanema.

Neste Dia Internacional da Mulher, 8 de março, contamos as histórias da paranista Itauana Morgenstern e da atleticana Maria Lúcia Wood Saldanha, que convivem com doenças raras e autoimunes e têm no futebol uma força extra para sorrirem. Porque ser mulher é conviver com desafios diários.

Oxigênio Tricolor

Arquivo pessoal
Arquivo pessoal

Itauana Morgenstern, 37 anos, é paranista apaixonada e não perde um jogo do Paraná. Há quatro anos, ela foi diagnosticada com Esclerodermia Sistêmica Sine Scleroderma. Uma doença rara e autoimune, que se caracteriza pelo excesso de produção de colágeno pelo organismo, formando espessamento e placas duras sobres a pele e, em alguns casos, endurecendo os órgãos internos.

Logo após descobrir a doença, no fim de 2017, Itauana passou 18 dias no isolamento da UTI, entre a vida e a morte, e saiu de lá dependente de um cilindro de oxigênio, porque a doença acabou acometendo seus pulmões. Em setembro de 2019, outro diagnóstico raro, Insuficiência Adrenal Secundária, que nada tem a ver com a Esclerodermia, exceto pelo fato de ambas serem autoimunes – ter uma doença autoimune é fator de risco para desenvolvimento de outras.

"Lembro que quando eu estava na UTI, o time estava de férias. Quando recebi alta, eu acompanhava de casa todas as notícias da pré-temporada, pensando em ir ao estádio assim que começasse o Paranaense. Mas estava muito fraca e debilitada e demorei dois meses para convencer meu marido de que eu precisava ir a um jogo", relembra Itauana.

A história dela ficou conhecida na torcida paranista ainda em 2017, quando ela foi até a Vila Capanema pela primeira vez com o cilindro de oxigênio. Coincidentemente, foi no dia 8 de março, na vitória do Paraná sobre o Bahia por 2 a 0, pela Copa do Brasil, que ela voltou a ver o Tricolor de perto.

"Foi uma grande preparação, mas deu tudo certo. Mesmo recebendo olhares de admiração, eu não entendia muito bem e não via méritos em meu feito, apenas queria estar lá e apoiar o grande amor da minha vida, como sempre fiz", conta Itauana, que foi acompanhada do marido e do cilindro de oxigênio, que pesa cerca de 8 quilos.

O ano de 2017 foi especial para ela e para o clube, que conquistou o acesso à elite após 10 anos longe da Primeira Divisão. A paranista chegou a receber jogadores em casa, participou de treinos, ganhou uma camisa autografada e, inclusive, recebeu apoio para comprar o concentrador de oxigênio portátil, que custa mais de R$ 15 mil reais. No aniversário de 30 anos do Paraná, em 19 de dezembro de 2019, também foi homenageada ao representar a torcida paranista e recebeu um troféu.

"O Paraná faz por mim muito mais do que eu serei capaz de agradecer um dia. Apenas posso continuar dedicando todo meu amor e apoio, independente da situação", diz.

Mas a paixão pelo Paraná começou lá atrás, em 2007, quando recebeu um convite do então namorado, hoje marido, Nelson Morgenstern Junior, para assistir a um jogo na Vila Capanema. Itauana é natural de Porto Alegre e vem de família gremista. Na época em que começou a frequentar a Vila Capanema, o Tricolor vivia uma de suas melhores fases ao disputar a Libertadores pela primeira vez.

"Lembro exatamente do momento em que entrei na Vila Capanema e senti uma energia invadir meu corpo e alma. Fiquei encantada pelo azul, vermelho e branco. Me apaixonei pelo clima do estádio, senti meu coração pulsar ao som da torcida. Difícil explicar, mas ali eu descobri que aquele era o meu lugar de paz. Depois disso, nunca mais deixei de ir aos jogos e apoiar o time", descreve.

A paranista apaixonada conta que, até descobrir a doença, definia sua rotina conforme a tabela de jogos do Paraná. E, depois de tudo que passou para seguir viva, o clube foi um motivador a mais para que ela não deixasse que o tratamento a abalasse.

"O Paraná sempre foi parte muito importante da minha vida e quem me conhece sabe disso. Sempre priorizei jogos e definia meus compromissos com base no calendário do time. Mas, depois dos diagnósticos, passou a ser uma motivação para que eu não desanimasse diante das dificuldades impostas pela nova vida", afirma.

A última temporada não foi fácil para o Paraná, que culminou no rebaixamento à Série C. Otimista com a vida, a gaúcha confia que logo o Tricolor também vai se reerguer.

"Eu sou muito otimista e isso me ajuda bastante no tratamento de saúde e na vida, de uma maneira geral. Com o Paraná não é diferente. Na queda do Paranaense, continuei apoiando e fui a todos os jogos que pude e vou continuar assim, agora com esta difícil queda para a Série C. Um tombo machuca, mas não me mantém caída por muito tempo. Sempre procuro aprender e evoluir com tudo que acontece, além de confiar plenamente nos planos de Deus", declara.

Sem se abalar com os problemas, a ex-analista financeira segue vivendo um dia de cada vez. Depois da grande mudança na vida, buscou novas atividades, gosta de fazer artesanato, de escrever, de lettering, meditação e ainda faz alguns movimentos fáceis da Yoga. Também criou o canal "Quem disse que eu não posso?", disponível no Facebook, Youtube e Instagram, para compartilhar suas experiências e ajudar quem também sofre com a Esclerodermia e outras doenças raras.

Por fim, o Paraná também se faz presente na vida dela com o Gralhas da Vila, movimento de torcedoras paranistas que lutam por uma arquibancada mais democrática. O oxigênio tricolor está por todo lado na vida de Itauana.

O corpo tem limitações, mas o coração pulsa rubro-negro

Arquivo pessoal
Arquivo pessoal

Advogada e com um filho de 21 anos, Maria Lúcia Wood Saldanha sempre foi muito ativa. Adorava viajar, curtir a vida e ir aos jogos do Athletico. Até que, em novembro de 2010, começou a sentir um desconforto no dedo indicador da mão direita. Não conseguia esticá-lo. Por viver digitando e escrevendo procurações, ofícios, documentos, acabou achando que fosse alguma lesão por esforço repetitivo.

Foram quase dois anos de exames até que conseguisse saber o diagnóstico correto. Era uma doença rara: a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), que ataca o sistema nervoso, enfraquecendo os músculos e afetando funções físicas. Não há cura. E a expectativa de vida média para quem convive com ELA varia de 2 a 5 anos.

"Do primeiro sintoma, já se passaram mais de 10 anos. Creio que não me entregar e viver um dia de cada vez, sem me vitimizar, contribuíram para que eu dobrasse a expectativa de vida", disse a sorridente Maria Lúcia, 52 anos.

E o amor pelo Athletico, que vem desde o berço, tem ajudado a advogada nesse tratamento. Desde pequena, Maria Lúcia foi influenciada pelo pai a acompanhar futebol. Ele a levava, junto dos outros cinco irmãos, ao Joaquim Américo, e os ensinou a torcer pelas cores rubro-negras. Toda a família torce pelo Furacão.

Maria Lúcia continuou acompanhando o Athletico pela TV e rádio, principalmente por suas obrigações no trabalho e com o filho pequeno. Voltou a ir à Arena da Baixada mais frequentemente após a Copa do Mundo de 2014, ficando encantada com o estádio e energia da torcida. Já tinha suas limitações por causa da evolução da doença, mas ainda conseguia se locomover com maior independência. Até que a fase mais difícil começou.

"2017 e 2018 foram anos muito difíceis para mim. Foram várias situações que ocorreram, que me deixaram à beira da morte. Isso culminou na traqueostomia. Após essa intervenção comecei a ficar estável e, devagar, fui melhorando, até que consegui sair para o primeiro passeio fora de casa, depois de quase três anos. Já no segundo passeio, quis retornar a um jogo do Athletico", revela.

A partir daí, começou um mobilização de todos que são presentes na rotina de Maria Lúcia. Para acompanhar o Athletico ao vivo, são necessários a técnica de enfermagem, ou familiar ou cuidador, uma bolsa com materiais de uso frequente e para emergências, adiantar ou atrasar horários de dieta ou medicações, verificar a carga de baterias do respirador e colocá-lo na cadeira de rodas, organizar o aspirador de secreção no carrinho de transporte. Além disso, é preciso agendar um táxi adaptado e acomodá-la adequadamente na cadeira de rodas para que fique confortável durante o período fora de casa.

Só não esteve presente em algumas situações, especialmente quando a temperatura estava muito baixa, para não comprometer a parte respiratória. Ela resume: "Valeu a pena. Em 2019, em especial, foi um ano de conquistas para o clube".

O Athletico deu à Maria Lúcia um ano de fidelidade para ir ao jogos em casa, além dela receber das mãos de Tiago Nunes uma camisa. O ano de 2019 também foi de alegrias dentro de campo. O Furacão conquistou o Campeonato Paranaense, a Levain Cup e a Copa do Brasil. E, hoje, a atleticana tem em Nikão e Santos seus jogadores favoritos.

"Creio que isso foi um combustível para eu voltar a viver. A cada jogo que assistia, sentia vontade de estar no próximo. E isso foi me ajudando a enfrentar obstáculos que, até então, eu achava que não conseguiria. Portanto, o Athletico me ajudou muito a voltar a ter qualidade de vida", conta.

Nessa pandemia, o que mais ela sente saudades é acompanhar o Furacão no estádio. E já deu seu recado. "Meu pedido para esse ano é que o Athletico ganhe mais um título importante".

Maria Lúcia se comunica apenas pelos olhos e consegue, vez ou outra, sorrir. Por um sistema de computador, ela consegue digitar fixando os olhos em cada letra para formar palavras. O sistema reproduz a frase com uma voz para que, assim, ela possa se expressar. Apesar das limitações, nada impede que Maria Lúcia viva a vida feliz e buscando realizações diariamente. Uma delas foi ter escrito e lançado um livro, intitulado "Como cresci com ELA", durante a pandemia.

"Atualmente, acho que trabalho até mais do que quando tinha um emprego. Só movimento os olhos e consigo ainda sorrir. Todo o resto da musculatura já foi afetada. Não tenho mais movimentos. Me alimento através de uma sonda ligada. Respiro com a ajuda de um ventilador mecânico. Mas sou muito feliz. Digitando com os olhos, eu administro a minha vida. Tenho uma coluna em um jornal de Curitiba, intitulada 'ELA com E.L.A.', com publicação semanal. Passeio, vou a shows, teatros, shoppings, jogos e viajo, quando autorizado. E durante a pandemia ainda escrevi um livro, pois as atividades externas ficaram bem reduzidas", finaliza.

O corpo de Maria Lúcia Wood Saldanha pode não ter a maioria dos movimentos, mas o coração e a alma ainda pulsam quando ela vê o Furacão em campo.

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