Com praticamente toda a carreira construída no futebol italiano, o meia Daniel Bessa, de 30 anos, não consegue esconder uma frustração em seus primeiros passos na bola.
Natural de São Paulo, ele se mudou com a família para Curitiba quando tinha apenas oito anos de idade. Assim que chegou, passou treinar no Coritiba, onde fez amizades e se sentia em casa.
Da mesma geração que o atacante Raphael Lucas e os meias Thiago Primão e Lucas Piazon, Bessa permaneceu no CT da Graciosa por quase cinco anos até que foi “obrigado” a virar a casaca e vestir a camisa do rival Athletico.
No fim de 2005, o Coxa foi rebaixado à Série B do Brasileiro. Um dos reflexos foi sentido diretamente na formação, que passou a ter menos investimento.
“Eles começaram cortar categorias menores e na época eu não era nem infantil. Todo mundo foi saindo porque não tinha mais treino. E com bastante dor no coração fui pro Athletico”, recorda Bessa, que atualmente veste a camisa 11 do Al Ittihad Kalba, dos Emirados Árabes Unidos.

O período no CT do Caju foi curto – apenas 11 meses –, mas impactou fortemente o restante da trajetória do jogador. Após a disputa de uma Copa Votorantim pelo Furacão, foi descoberto por olheiros da Inter de Milão.
Depois de seis meses de transição, indo e voltando para a Itália, assinou com o clube quando completou 16 anos. “Inicialmente não queria ir de jeito nenhum, mas eu já tinha dupla cidadania, tenho ascendentes italianos por parte de pai e mãe, e meu irmão estava jogando futsal no país. Então ficou mais fácil”, diz.

Bessa se adaptou rápido e chegou a ser convocado para defender a Azurra nas categorias de base. Em julho de 2012, porém, quando estava próximo de fazer sua transição para o profissional, uma lesão ligamentar no joelho direito mudou todos os planos.
“Nós tínhamos vencido a Champions League de juniores e estávamos na final do Italiano, contra a Lazio. Eram 35 minutos do primeiro tempo, driblei um adversário e depois pulei para escapar de um carrinho. Foi quando o cruzado estourou”, conta o ítalo-brasileiro.
Foram sete meses de recuperação até retornar aos gramados, mas a estreia pela Inter de Milão nunca veio. Bessa acabou emprestado diversas vezes para times como Vicenza-ITA, Olhanense-PO, Sparta Rotterdam-HOL e Bolonha-ITA, até chegar ao Verona, na temporada 2016/2017.
Foi lá que o meia se firmou e acabou comprado por 1,2 milhão de euros. “Chegou um ponto em que eu não me sentia mais um moleque e não queria mais ficar sendo emprestado”, diz o jogador, que transformou seu jeito de jogar ao padrão italiano.
“Você melhora em algumas coisas, talvez perde outras. O jogo aqui é mais com a mentalidade tática e coletivo, um foco menos individualista. Fiz minha carreira em vários níveis, joguei a Série B por três anos, então me adaptei bem tanto fora quanto dentro de campo”.

Profissionalismo e ousadia (exagerada)
Na Itália, especialmente quando ainda estava na base da Inter, Bessa viu de perto duas faces da moeda do futebol.
Se observou de perto o profissionalismo de nomes como dos argentino Javier Zanetti, Walter Samuel e do brasileiro Thiago Motta, também conheceu o talento em estado puro e a ousadia de Mario Balotelli.
“O Balotelli era três anos mais velho que eu, mas também morava no centro de treinamentos e ia para a escola com a gente. Ele já estava explodindo no time principal e às vezes eu ficava dando a bola no treino de finalização deles. Ele ganhava do Eto’o, do Sneijder, e não tava nem aí, tirava sarro na cara deles”, relembra.
“O bicho tinha tudo. Foi muito bem na carreira, mas longe daquilo que poderia ter sido pelo potencial dele”, completa Bessa.

Inter de Mourinho e lições de resiliência
Repleta de brasileiros, como o zagueiro Lúcio, o lateral Maicon e o goleiro Júlio César, a Inter venceu quase tudo que disputou em 2009/2010.
Comandado pelo português José Mourinho, o clube faturou o Campeonato Italiano, a Copa da Itália e a Champions League, perdendo apenas a final da Supercopa da Itália. Então com 16 anos, Bessa vivenciou àquela temporada mágica e guardou todos os ensinamentos que pôde.
Quem mais o ajudou foi Thiago Motta, nascido no Brasil, mas que optou por defender a Itália.
“Esse cara é fora da curva. Naquela época ele já tinha cinco operações no joelho e chegava duas horas antes no CT, saia duas horas depois. Esse profissionalismo, a maneira com que lidava com a carreira, ficou marcado pra mim. Quando eu me machuquei, lembrava muito de como ele se comportava”, fala.

Sonho incompleto
Em 2020, durante a pandemia, o meia jogou pela primeira vez no Brasil como profissional. Foram 23 jogos e cinco gols pelo Goiás, mas retornou ao Verona antes do término do Brasileirão.
Na última temporada, numa escolha motivada por questões familiares, assinou com o Al Ittihad Kalba, time com o qual tem mais uma temporada de vínculo.
A vontade, no entanto, é de defender o Coxa. Houve conversas em outras ocasiões, como em 2022, mas elas nunca evoluíram. Quem sabe no futuro?
“Não sei quando, mas tenho o sonho de jogar no Coritiba, no Couto Pereira. Não sei se vão me quer também, mas meu projeto ideal, meu desejo, é esse. Vai depender de tudo um pouco para dar certo”, conclui Bessa, que tem base estabelecida em Curitiba e, durante as férias, assistiu jogos do Alviverde no estádio.
