colunas e Blogs
Papo Olímpico
Papo Olímpico

Papo Olímpico

Invasão da Ucrânia

As sanções esportivas contra os russos vão funcionar?

Por
Marcio Antonio Campos
30/03/2022 17:10 - Atualizado: 04/10/2023 16:51
O russo Evgeny Rylov após vencer os 100 metros costas em Tóquio-2020: nadador apoia a invasão da Ucrânia e participou de evento pró-Putin em Moscou.
O russo Evgeny Rylov após vencer os 100 metros costas em Tóquio-2020: nadador apoia a invasão da Ucrânia e participou de evento pró-Putin em Moscou. | Foto: Fernando Bizerra/EFE

Quem acompanha a coluna desde antes de ela ser coluna sabe que, para mim, a Rússia deveria estar fora de qualquer competição esportiva, seja como país ou como instituição esportiva representativa (federações ou o tal do “ROC”), como consequência de todas as trapaças realizadas pelo esquema estatal de doping que o país implantou há cerca de uma década. Isso não foi feito, e foi preciso que Vladimir Putin invadisse a Ucrânia para finalmente a Rússia acabar banida – a punição começou nos Jogos Paralímpicos de Inverno de Pequim. Mas agora passou-se de um extremo a outro: a frouxidão do tal “ROC” foi substituída pela proibição pura e simples para todos os atletas russos, que não podem nem mesmo competir como independentes, sob bandeira neutra.

Claro, as sanções esportivas são apenas parte de um pacote
maior de medidas de todo tipo, especialmente econômicas, destinadas a forçar o
agressor – no caso, a Rússia de Putin – a recuar. Vai funcionar?

A sanção perfeita seria aquela que 1. ferrasse quem merece ser ferrado, 2. poupasse quem merece ser poupado e 3. fizesse tanto estrago que aqueles que estivessem sendo ferrados fossem forçados a repensar suas políticas. Mas não creio que isso exista atualmente. A maioria das sanções que temos visto prioriza a combinação de (1) e (2), mas com isso não consegue (3) e isso acaba mantendo as coisas como estão – vejam o caso da ditadura venezuelana ou, no mundo esportivo, o próprio caso das punições pelo esquema russo de doping. Mas agora as entidades esportivas partiram para esquecer o (2) na tentativa de chegar ao (3) – é a combinação que funcionou em ao menos um caso concreto: o do apartheid sul-africano (mas, claro, as sanções esportivas não foram o único, e provavelmente nem o principal, fator a forçar o fim do regime racista). Havia atletas sul-africanos brancos que não eram racistas? Muito provavelmente sim, e pagaram pelo racismo dos outros. Assim como há atletas russos contrários à invasão da Ucrânia, e que estão pagando o pato pela insanidade do seu presidente.

Até agora, ou ao menos nos últimos 70 anos, guerras e invasões nunca tinham sido pretexto para um banimento completo dos atletas de um determinado país

(aliás, vejam o excelente episódio da série Foul Play sobre atletas sul-africanos que tiveram suas carreiras afetadas pelas sanções internacionais.)

O problema, aqui, é o critério. A severidade da sanção não é inédita, mas a combinação entre o crime e o castigo sim. Até agora, ou ao menos nos últimos 70 anos, guerras e invasões nunca tinham sido pretexto para um banimento completo dos atletas de um determinado país. Mesmo quando Slobodan Milošević estava aterrorizando os Bálcãs com sua limpeza étnica, iugoslavos foram aos Jogos Olímpicos de Barcelona, em 1992, como independentes. Que eu me lembre, a única vez que havia ocorrido uma proibição total da participação de atletas de um país em competições internacionais foi justamente no caso sul-africano. E, de fato, o apartheid era outra coisa, uma política baseada em uma filosofia (se dá pra chamar assim) desumanizadora, que nega a dignidade do ser humano por causa da cor de sua pele. Não estou, com isso, minimizando a guerra; estou é maximizando o racismo.

Se a partir de agora agressões militares de um país contra outro resultarem no banimento puro e simples de todos os atletas da nação agressora, pressinto que as autoridades esportivas arrumarão muita sarna para se coçar, e não demorará muito para aparecerem incoerências. Talvez tivesse sido melhor manter a prática dos “atletas independentes” ou “neutros”, permitindo a participação de russos nos esportes individuais (nada de times, portanto) sempre sob bandeira neutra, e analisando novas punições caso a caso – por exemplo, para os atletas que participaram de um evento pró-invasão em um estádio de Moscou ou que exibem símbolos associados à invasão, como o tal do “Z”.

Velhos vícios no COB

Quando você tem um executivo que trabalha bem, usa os meios mais modernos à sua disposição, é querido pelos subordinados e entrega os melhores resultados da sua empresa em toda a história, o que você faz com ele? Pois o COB demitiu. O presidente da entidade, Paulo Wanderley, mandou embora Jorge Bichara, o diretor de Esportes que esteve por trás das excelentes campanhas brasileiras em Lima e em Tóquio (quando tivemos o recorde de medalhas olímpicas em uma edição). Por quê? Disputa de poder, claro. No Olimpíada Todo Dia, Fernando Gavini explicou que Bichara era do grupo do vice-presidente do COB, Marco LaPorta, que deve disputar o comando da entidade em 2024, contra Wanderley. “Culpado por associação”, o diretor caiu, já que Wanderley não pode demitir seu vice.

Atletas e ex-atletas reagiram nas mídias sociais, alguns com críticas mais veementes, outros preferindo apenas elogiar o diretor demitido. Como os patrocinadores do COB viram isso, não sabemos. Mas eu, se fosse um desses patrocinadores grandes, já teria chamado Wanderley pra uma conversa e dito “olha, nós botamos dinheiro aqui contando com uma administração profissional, não pra você ficar fazendo cartolice”. Porque não dá para o movimento olímpico brasileiro retomar velhos vícios justamente quando estamos decolando.

Veja também:
Ídolo do Flamengo, Diego Ribas renova contrato com a Globo
Ídolo do Flamengo, Diego Ribas renova contrato com a Globo
Athletico divulga lista de 50 jogadores inscritos na Sul-Americana com jovens da base
Athletico divulga lista de 50 jogadores inscritos na Sul-Americana com jovens da base
Jornais espanhóis elogiam Endrick após gol decisivo: "Nasceu uma estrela"
Jornais espanhóis elogiam Endrick após gol decisivo: "Nasceu uma estrela"
Athletico e Maringá podem fazer uma grande decisão de campeonato
Athletico e Maringá podem fazer uma grande decisão de campeonato
participe da conversa
compartilhe
Encontrou algo errado na matéria?
Avise-nos
+ Notícias sobre Papo Olímpico
Como a Copa pode ajudar ou atrapalhar as pretensões olímpicas do Catar
Jogos Olímpicos de 2036

Como a Copa pode ajudar ou atrapalhar as pretensões olímpicas do Catar

Como proporcionar uma grande experiência olímpica aos voluntários
Entrevista

Como proporcionar uma grande experiência olímpica aos voluntários

Russos fazem o mundo esportivo de otário mais uma vez
Kamila Valieva

Russos fazem o mundo esportivo de otário mais uma vez