colunas e Blogs
Papo Olímpico
Papo Olímpico

Papo Olímpico

Esporte e política

Vem aí uma nova delegação, o “BOC” #sóquenão

Por
Marcio Antonio Campos
06/08/2021 20:14 - Atualizado: 04/10/2023 17:38
Krystsina Tsimanouskaya (à esquerda) durante eliminatória dos 100 metros em Tóquio: atleta foi impedida de participar dos 200 metros após integrantes da delegação tentarem tirá-la à força do Japão.
Krystsina Tsimanouskaya (à esquerda) durante eliminatória dos 100 metros em Tóquio: atleta foi impedida de participar dos 200 metros após integrantes da delegação tentarem tirá-la à força do Japão. | Foto: Valdrin Xhemaj/EFE/EPA

Lembram de Uday Hussein, o filho de Saddam que era também presidente do Comitê Olímpico Iraquiano e da Associação de Futebol do Iraque, e que era famoso por agredir e torturar atletas que tinham desempenho ruim em competições internacionais? Pois ele parece ter admiradores na Belarus. O COI abriu uma investigação para apurar o bizarro caso da velocista Krystsina Tsimanouskaya, que escapou por pouco de ser arrastada de volta para Minsk contra a vontade; além disso, expulsou de Tóquio dois membros da delegação, incluindo o técnico da equipe de atletismo. O COI quer saber até onde o caso tem o dedo do presidente do comitê olímpico da Belarus, Viktor Lukashenko, filho do ditador Alexander Lukashenko – aquele mesmo que mandou desviarem um avião comercial de sua rota para conseguir prender um opositor que estava a bordo.

Tsimanouskaya, que disputou os 100 metros rasos, mas não passou para as semifinais, criticou seus técnicos pelas mídias sociais por ter sido incluída na equipe do revezamento 4x400 após duas outras corredoras terem sido impedidas de competir por falta de testes antidoping. Depois disso, segundo o seu relato, o chefe da equipe de atletismo lhe disse que havia ordens superiores para retirá-la da Vila Olímpica e levá-la ao aeroporto, para pegar um voo de volta para Minsk. Oficialmente, o comitê olímpico nacional alegou que Tsimanouskaya tinha abandonado os Jogos por decisão médica, após avaliação de seu estado mental e emocional. Os cartolas da Belarus só não esperavam que a atleta escapasse no aeroporto e procurasse policiais japoneses, dizendo estar sendo embarcada em um voo contra a sua vontade – em entrevista à Reuters, Tsimanouskaya disse ter tomado a decisão de fugir após conversar ao telefone com sua avó, a caminho do aeroporto, e ter ouvido dela que não seria seguro retornar à Belarus. Tchecos e poloneses ofereceram ajuda à velocista, que aceitou um visto humanitário polonês e voou para Varsóvia na quarta-feira. Seu marido fugiu da Belarus assim que o episódio estourou, e o casal se reencontrou na capital polonesa.

Ainda que o episódio envolvendo Tsimanouskaya jamais tivesse acontecido, a repressão contra atletas em Belarus já seria mais que suficiente para garantir a pena mais severa, de suspensão do país das competições internacionais

Na mesma entrevista, Tsimanouskaya disse jamais ter se envolvido com política, mas outros atletas do país que criticaram a ditadura de Lukashenko e participaram de protestos contra o governo chegaram até a ser presos. O COI já aplicou algumas punições ao comitê olímpico da Belarus – a entidade parou de receber repasses do COI; nem o ditador Lukashenko nem seu filho Viktor puderam ir a Tóquio; e a eleição de Viktor como presidente do órgão esportivo, no início deste ano (sucedendo o pai no posto, aliás), não foi reconhecida pelo COI. Mas parece que não foi suficiente, e aumentaram as pressões para que a Belarus seja finalmente suspensa do movimento olímpico.

Por muito menos comitês olímpicos nacionais já foram suspensos, pois o COI não tolera interferências políticas nas entidades que administram o esporte em nível nacional. Até o Comitê Olímpico Brasileiro já levou um gancho durante as investigações da compra de votos para que o Rio de Janeiro se tornasse a sede dos Jogos de 2016. Convenhamos que perseguir atletas e botá-los na cadeia por suas convicções políticas é bem mais grave que isso. Ainda que o episódio envolvendo Tsimanouskaya jamais tivesse acontecido, a repressão em Belarus já seria mais que suficiente para garantir a pena mais severa.

+ Siga o quadro de medalhas da Olimpíada de Tóquio 2021 em tempo real!

+ Olimpíada de Tóquio 2021: veja o calendário com datas e horários dos eventos e marque na agenda!

E, se ela vier, o que vai acontecer? Veremos nos Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim, ano que vem, uma nova delegação, o “BOC”, significando “Comitê Olímpico da Belarus”, com uniformes verdes, vermelhos e brancos, bandeirinha própria e quem sabe uma melodia de Irving Berlin para seus atletas campeões? Pode apostar que não. Afinal, Lukashenko é um pária internacional e a Belarus não é uma potência olímpica como o seu vizinho ao leste, que mesmo montando um megaesquema estatal de doping conseguiu uma série de privilégios, incluindo o envio de atletas para modalidades coletivas, o que lhes permitiu fazer o 20 a 12 tomar temporariamente o lugar do 7 a 1 como a grande assombração esportiva brasileira. O mais provável é que, havendo suspensão, os bielorussos participem como Atletas Olímpicos Independentes, com uniforme de uma cor neutra qualquer, com a bandeira e o hino olímpico caso cheguem ao pódio.

E, se isso ocorrer, desta vez o COI estará totalmente certo – errado esteve quando permitiu aquela piada em azul, vermelho e branco em Tóquio. E eu estarei aqui, pronto para dizer: “enfim, a hipocrisia”.

Veja também:
Em 70 dias de temporada, Coritiba chegou a 10 atletas lesionados
Em 70 dias de temporada, Coritiba chegou a 10 atletas lesionados
Na mira do Athletico, atacante Vargas será reavaliado por novo técnico do Atlético-MG
Na mira do Athletico, atacante Vargas será reavaliado por novo técnico do Atlético-MG
Cuca confirma atacante ex-Flamengo fora do Athletico
Cuca confirma atacante ex-Flamengo fora do Athletico
Fluminense espera acordo nas próximas semanas para renovar com Diniz
Fluminense espera acordo nas próximas semanas para renovar com Diniz
participe da conversa
compartilhe
Encontrou algo errado na matéria?
Avise-nos
+ Notícias sobre Papo Olímpico
Como a Copa pode ajudar ou atrapalhar as pretensões olímpicas do Catar
Jogos Olímpicos de 2036

Como a Copa pode ajudar ou atrapalhar as pretensões olímpicas do Catar

Como proporcionar uma grande experiência olímpica aos voluntários
Entrevista

Como proporcionar uma grande experiência olímpica aos voluntários

Russos fazem o mundo esportivo de otário mais uma vez
Kamila Valieva

Russos fazem o mundo esportivo de otário mais uma vez