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Boicotes

Pressão sobre a China, antes tarde do que nunca

Por
Marcio Antonio Campos
08/12/2021 01:32 - Atualizado: 04/10/2023 17:09
Peng Shuai durante partida no Australian Open de 2020: preocupação com segurança da atleta levou WTA a suspender torneios na China.
Peng Shuai durante partida no Australian Open de 2020: preocupação com segurança da atleta levou WTA a suspender torneios na China. | Foto: Francis Malasig/EFE/EPA

A WTA ameaçou e cumpriu. A entidade que coordena o tênis feminino internacional anunciou a suspensão de seus torneios tanto na China continental quanto em Hong Kong. O motivo é a preocupação com a segurança da tenista Peng Shuai, que no início de novembro denunciou a agressão sexual cometida por um figurão do Partido Comunista Chinês em uma publicação nas mídias sociais. Além de o texto ter sido imediatamente censurado, Peng sumiu para reaparecer vários dias depois, em circunstâncias bastante controladas. Mesmo depois que o presidente do COI, Thomas Bach, aceitou a humilhação de ser coadjuvante de um teatrinho por videoconferência, a WTA diz não ter certeza de que Peng está bem e livre. Aliás, ninguém que observe o que está acontecendo e saiba ligar os pontos pode dizer que Peng está bem e livre.

Sabem aquela história de “put your money where your mouth is”? Pois é aqui que temos de aplaudir, e muito, a atitude da WTA. A entidade, em nome da preocupação com a segurança de uma de suas atletas, está abrindo mão de uma boa grana movimentada pelos torneios chineses. Em 2019, o último ano “normal” do esporte mundial, houve sete torneios da WTA no país, incluindo um Premier Mandatory (o nível mais alto depois dos Grand Slams), um Premier 5 (o nível seguinte) e um Premier. Além disso, os campeonatos de fim de ano, que reúnem as melhores tenistas da temporada, também foram realizados na China em 2019 e deveriam continuar por lá até 2030, mas o sumiço de Peng mudou tudo.

A ATP, que cuida do circuito masculino, e a ITF, a Federação Internacional de Tênis, não seguiram o exemplo da WTA; com alguma sorte, veremos as estrelas do tênis masculino recusando-se a jogar na China. O tênis feminino dá o exemplo que não vemos em outras entidades esportivas cheias de bom-mocismo de fachada. Caso emblemático é o da NBA, que dentro dos Estados Unidos comprou todo o pacote identitário, mas pisa em ovos quando o assunto são algumas outras vidas que também importam, como as dos uigures e tibetanos. Daryl Morey, gerente-geral do Houston Rockets, tuitou em defesa dos manifestantes pela democracia em Hong Kong em 2019 e acabou apagando o tuíte; ele, a equipe e o astro James Harden pediram desculpas pelo episódio. O pivô turco Enes Kanter, do Boston Celtics, tem sido mais corajoso; chamou Xi Jinping de “ditador”, pediu a liberdade do Tibete e continuou falando também em defesa dos uigures mesmo depois que os parceiros da NBA na China pararam de transmitir os jogos dos Celtics em seus serviços de streaming. Kanter, que também critica o presidente turco Recep Tayyip Erdogan, vem usando tênis com mensagens em apoio aos grupos oprimidos pela ditadura comunista chinesa.

Enfim, o boicote

O governo norte-americano anunciou um “boicote diplomático” aos Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim, em fevereiro do ano que vem, para protestar contra o genocídio (e a Casa Branca usou mesmo essa palavra!) dos uigures “e outros abusos de direitos humanos”. Os atletas participarão normalmente – a não ser que alguém queira boicotar o evento por conta própria –, mas nenhuma autoridade norte-americana viajará à China. A Nova Zelândia já tomou a mesma decisão, que está sendo estudada por Austrália e Canadá. Quem sabe a atitude dos Estados Unidos acabe encorajando um movimento mais amplo.

Curiosa foi a resposta chinesa ao anúncio norte-americano. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores “sentiu”, para usar a imortal expressão de Tino Marcos, e só faltou ameaçar uma chuva de fogo do céu sobre Washington. Já o Global Times, jornal da mídia estatal, quase afirmou que os norte-americanos estavam fazendo um favor, e que no fim os chineses nem queriam mesmo que as autoridades dos EUA aparecessem para não espalhar Covid-19 (o que, vindo do país natal do Sars-CoV-2, não deixa de ser uma ironia estranha):

https://twitter.com/globaltimesnews/status/1468022997223378945https://twitter.com/globaltimesnews/status/1467924734524497921

Quando escrevi sobre o assunto aqui na coluna, disse que a China não mudaria em nada sua política ainda que houvesse um boicote massivo, mas que também não havia como ignorar todas as barbaridades promovidas pela ditadura chinesa. Então, o boicote diplomático surge como uma opção que ao menos chama a atenção do resto do mundo. Além disso, continuo torcendo para que os atletas aproveitem a flexibilização das normas sobre liberdade de expressão na Carta Olímpica para defender os tibetanos, os uigures e os manifestantes de Hong Kong durante os Jogos.

Show em Cali-Valle

Não é culpa nossa se os Estados Unidos e o Canadá não
mandaram seus principais atletas para os primeiros Jogos Pan-Americanos Júnior
na Colômbia, certo? O Brasil deu show, terminou a competição no topo do quadro
de medalhas com 59 ouros (11 a mais que os colombianos) e classificou vários
atletas para o Pan de Santiago, em 2023.

O brasileiro que acompanha esporte olímpico sabe que
competição continental é uma coisa, e Jogos Olímpicos são outra; nem sempre um
megamedalhista de Pan traz resultados no ano seguinte. Mas isso é o de menos
para esses jovens atletas. O Pan Júnior aceita competidores de até 22 anos; muitos
deles já estão “velhos” para ir aos Jogos Olímpicos da Juventude, em que o
limite é 18 anos, e também não estão em nível olímpico para sonhar com Paris ou
Los Angeles – talvez nem mesmo conseguissem estar em um Pan-Americano. Para
esses, Cali-Valle-2021 é única chance de estar em uma competição de maior porte,
viver o cotidiano de uma vila de atletas, competir sentindo a pressão de um
evento megadesportivo internacional. Claro que torcemos para ver essa garotada
toda compondo o Time Brasil em outras ocasiões, mas, sendo realistas, sabemos
que só uma parte desses atletas voltará a usar nosso uniforme no futuro. Os
demais, no entanto, sempre terão ao menos as memórias (e, quem sabe, alguma
medalha) desse Pan Júnior e o orgulho de terem representado o Brasil nesse
evento pioneiro.

Aliás, o nosso desempenho bem podia animar alguma cidade a se candidatar para receber o Pan Júnior no futuro, não? Se 2025, com sede ainda indefinida, está muito em cima, que tal se planejar para 2029?

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