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André Pugliesi
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A tarde em que Eurico Miranda tirou o bi brasileiro do Athletico

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André Pugliesi
12/03/2019 18:53 - Atualizado: 29/09/2023 23:35
Agência Estado e Albari Rosa/Gazeta do Povo
Agência Estado e Albari Rosa/Gazeta do Povo

Eu estava lá e vi tudo com os meus próprios olhos. Repórter do extinto jornal Arquibancada, fui destacado para cobrir Vasco e Atlhetico, em São Januário, pela penúltima rodada do Brasileirão de 2004, duelo que acabou vencido pelos cariocas por 1 a 0.

O Furacão brigava cabeça por cabeça com o Santos, numa disputa de 24 equipes e longas 46 rodadas (agora são 38). E foi a campo com 83 pontos, dois à frente do rival, que tinha 81. Ou seja, restando duas rodadas, dependia apenas de si para garantir o bicampeonato nacional. E jogava a última na Baixada.

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O que ocorreu no bairro de São Cristovão, entretanto, foi surreal. Então presidente do Vasco, Eurico Miranda, falecido nesta terça-feira (11), era desafeto declarado de Mario Celso Petraglia, dirigente do Rubro-Negro à época, hoje líder do Conselho Deliberativo do clube.

Os dois teriam, inclusive, trocado socos numa reunião do Clube dos 13, meses antes da partida, por causa da distribuição de cotas de televisão. Não há comprovação das vias de fato. De certo, que o confronto pelo Nacional era encarado como outro round.

Para esquentar ainda mais o cenário, a representação cruz-maltina estava ameaçada pelo rebaixamento. Com 51 pontos, um revés e os donos da casa poderiam chegar para o jogo derradeiro afundados na zona da degola. Assim, o Vasco precisava vencer ou vencer.

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Esgrimando pelas ruelas de paralelepípedos de São Cristovão, uma área antiga próxima do centro do Rio, o taxista nos largou, eu e colegas da Gazeta, como o hoje editor Rodrigo Fernandes, nos fundos de São Januário, onde fica posicionada a piscina do clube.

Apesar do acesso intrincado, é o lado mais tranquilo, até meio bucólico, da região que abriga a praça esportiva vascaína. Do outro, bastando atravessar a rua que margeia o reduto alvinegro, está a Barreira do Vasco, comunidade controlada pela organização criminosa Comando Vermelho.

Para escapar do descenso e “afogar” o Furacão, que vinha embalado pelo triunfo épico diante do São Caetano (5 a 2), Eurico Miranda pôs ingressos a R$ 1 e, praticamente, abriu os portões de São Januário. Horas antes e o estádio já pulsava, aparentemente superlotado.

Albari Rosa/Gazeta do Povo

Fomos posicionados na área de imprensa, no meio do setor social, sem divisão alguma com os torcedores. Dava para sentir o “bafo” do lado de fora, com milhares de vascaínos forçando as entradas para invadir o estádio. Dentro, crianças invadiam o campo livremente, para chutar bola.

Relatos da delegação atleticana, sobre a chegada para a partida, são de filme de terror. Objetos eram arremessados contra o ônibus, que encalacrava a cada esquina. Segundo alguns atletas, a polícia montada do Rio de Janeiro teve de usar espadas para abrir caminho. Você não leu errado: espadas.

Enquanto isso, dezenas de ônibus com torcedores rubro-negros, ávidos por empurrar a equipe rumo ao bi, eram barrados pela polícia antes de entrar no Rio. A justificativa: não era possível garantir a segurança e uma aproximação a São Januário detonaria uma barbárie.

Albari Rosa/Gazeta do Povo

Antes de a bola rolar, os jogadores do Furacão reclamaram das condições do vestiário, inabitável. De acordo com integrantes da comissão técnica, as paredes haviam sido pintadas naquele domingo e o ar estava irrespirável. Os atletas tiveram de se refugiar no gramado.

Dentro de campo, o time comandado por Levir Culpi e Washington sucumbiu diante da pressão. Na reta de frente para as sociais, a Força Jovem, principal organizada vascaína, pulava e cantava formada por, sei lá, mais de cinco mil pessoas. Só vi igual no Monumental de Nuñez.

Albari Rosa/Gazeta do Povo

Lá do alto, estatelado no camarote com cara de sala de estar, baforando seu charuto, Eurico Miranda assistia a tudo. Petraglia não foi ao Rio de Janeiro. Apito final, e deu-se a explosão da torcida, com o alívio da fuga da degola, graças ao jogaço de Petkovic e o gol do zagueiro Henrique.

Faltava, ainda, o ato final. Foi quando Miranda irrompeu no gramado, ladeado por seguranças, esbaforido. E, do campo de São Januário, seu reino pessoal por décadas, puxou o grito característico: “Casaca, casaca, casaca, a turma é boa, é mesmo da fuzarca: Vasco, Vasco, Vasco”.

Em tempo: enquanto o Athletico perdeu, o Santos venceu o São Caetano, por 3 a 0, e assumiu a liderança. Na última rodada, o Athletico empatou na Arena com o Botafogo, 1 a 1, e o Peixe bateu o Vasco, livre do descenso e reserva, por 2 a 1, sagrando-se campeão brasileiro.  

Lembre abaixo outras duas passagens envolvendo Miranda e o futebol paranaense, publicadas anteriormente pela Gazeta do Povo:

O dia que levou o Coritiba para a Série B

O rebaixamento do Coritiba à Segunda Divisão, em 1989, teve influência de Eurico Miranda, na época diretor de seleções da CBF. Foi ele quem fez o jogo do Vasco contra o Sport ser adiado para depois do confronto entre Coxa e Santos – o time carioca tinha três jogadores na seleção brasileira.

O Alviverde se recusou a entrar em campo contra o Peixe porque o jogo entre cariocas e pernambucanos foi transferido para três dias depois do jogo do Coxa. O Sport era um concorrente por uma vaga na segunda fase e, portanto, entraria em campo já sabendo o resultado necessário para a classificação.

Resultado: o Coritiba não viajou para encarar o Santos amparado, em tese, por uma liminar concedida pelo STJD. Mas o resultado foi considerado W.O. pela CBF e o clube foi rebaixada à Segundona.

A noite sem fim do Paraná em São Januário

Em 1999, o dirigente cruzmaltino aprontou com o Paraná. A partida em São Januário, válida pelo Brasileiro, estava empatada por 1 a 1 quando o vice-presidente de futebol entrou em campo e protagonizou uma cena emblemática de seu intempestivo temperamento.

Com dois jogadores a menos – Juninho Pernambucano e Alex Oliveira foram expulsos –, Eurico não aguentou assistir ao zagueiro Mauro Galvão receber o vermelho do árbitro Paulo César Oliveira. Entrou em campo, caminhou até o juiz e disparou: ‘o senhor é um irresponsável. Fazer uma coisa dessas com o estádio cheio do jeito que está. E mais irresponsável é quem escalou o senhor para apitar essa partida’, repetiu, em tom de ameaça. Enquanto isso, a torcida gritava o nome do dirigente.

O tumulto foi tão grande que Paulo César encerrou o jogo escoltado pela Polícia Militar (PM), prejudicando o Tricolor, que teria pelo menos três minutos, mais os acréscimos, para tentar a virada com o time completo contra oito jogadores. Para piorar, na saída do estádio, o carro em que o árbitro estava acabou atropelando um torcedor do Vasco.

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