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André Barcinski
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Crônica

Há 20 anos, “Careca do Talco” ressuscitou

Por
André Barcinski
27/10/2021 11:52 - Atualizado: 04/10/2023 17:22
Há 20 anos, “Careca do Talco” ressuscitou
| Foto: Reprodução

Fim de 2001. Meu amigo Heitor D’Alincourt e eu andamos pelo
subúrbio do Rio em busca de um personagem misterioso. Tínhamos uma descrição da
casa onde ele supostamente morava, mas a pista podia muito bem ser falsa. Fazia
um bom tempo que ninguém o via.

O personagem era conhecido por “Careca do Talco” e, para torcedores do Fluminense, como Heitor e eu, ele era uma lenda.

Desde que comecei a frequentar estádios, em meados dos anos
1970, me acostumei a ver o Careca, de camisa branca de mangas compridas com um
escudo do Fluminense no peito, uma bandeira tricolor nas costas como uma capa,
bandana tricolor na testa e o corpo inteiro coberto de talco. Ele andava pelas
arquibancadas – do Maracanã, Laranjeiras, Ítalo Del Cima, Rua Bariri, Godofredo
Cruz – jogando talco na cabeça de todo mundo. Na minha imaginação infantil, ele
era o verdadeiro super-herói tricolor.

Naquele início dos anos 2000, Careca estava sumido. Muitos
diziam que ele tinha morrido de complicações pulmonares resultantes de décadas
de ingestão de talco. Heitor e eu estávamos filmando um documentário
independente, “Saudações Tricolores”, a ser exibido no ano seguinte, 2002,
centenário do clube. Nossa missão era achar o Careca. Ou pelo menos descobrir o
que havia acontecido com ele.

Chegamos à casa, um sobrado simples, e tocamos a campainha.
Nada. Mais alguns minutos, e percebemos uma movimentação na porta. Uma senhora
abriu e perguntou o que queríamos. “Aqui é a casa do Careca?”, perguntamos.  Ela titubeou. “Ah, meu filho, ele não quer
mais saber do Fluminense não”.

EUREKA! CARECA VIVE!

A senhora era esposa do Careca e nos contou o ocorrido: havia algum tempo, o coitado fora cercado e ameaçado por torcedores de um clube rival especializado em remo. Careca ficou tão traumatizado pelo susto que decidiu nunca mais ir ao estádio.

Depois de vários minutos de negociação, a senhora nos
permitiu falar com o marido. Entramos na casa e lá estava ele: Careca do Talco
em pessoa!

Ligamos a câmera e começamos a entrevistá-lo. Careca – ou
melhor, Guilhermino dos Santos - começou a contar sua vida. Falou de suas
primeiras idas ao Maracanã e de seu amor pelo clube. A cada minuto, ele se
soltava mais. Dava para perceber que as memórias o emocionavam. Aí,
subitamente, ocorreu um fenômeno que até hoje não consigo explicar: Guilhermino
foi simplesmente possuído pelo espírito do Careca!  Ele correu para um quarto, abriu um armário e
tirou todo seu arsenal de super-herói: capa, camisa, bandana e um imenso saco
de talco, tão antigo que boa parte já estava empedrado. Vestiu a roupa de
super-herói tricolor e foi para a frente da casa, onde encontrou um vizinho
flamenguista e, sem pensar, cobriu o infeliz de talco. Heitor e eu chorávamos
de tanto rir.

O fato é que Careca ressuscitou naquele dia. Em 2 de julho
de 2002, na festa de comemoração pelo centenário do clube, nas Laranjeiras, lá
estava ele, vestido dos pés à cabeça, jogando talco em todo mundo. Nem o ídolo
Telê Santana escapou de ser batizado.

Foi o “grand finale” de Careca. Exatos cinco meses depois, em 2 de dezembro de 2002, Guilhermino morreu de um derrame. Dessa vez, de verdade. Foi uma despedida comovente de um ídolo de todos os torcedores do Fluminense.

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