Opinião

“14 Montanhas”: história incrível, num filme nem tanto

O alpinista nepalês Nirmal Purja (foto acima) entrou para a história com um feito impressionante: escalou os 14 picos do mundo com mais de oito mil metros de altitude em seis meses e seis dias, obliterando o recorde anterior do sul-coreano Kim Chang, que era de sete anos.

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Purja teve
uma grande vantagem em relação a Chang, já que, diferentemente do sul-coreano,
usou oxigênio suplementar acima de oito mil metros de altitude. Mesmo assim,
foi uma conquista e tanto.

Os 14 picos
mais altos se distribuem em quatro países – Nepal, China, Paquistão e Índia – e
incluem os famosos Everest (o mais alto, com 8849 metros), o K2 (8611 metros de
uma escalada das mais perigosas) e o Shishapangma, na China, o último a ser
escalado pela primeira vez, em 1964.

Purja nasceu
no Nepal e mudou-se para a Inglaterra em 2009, depois de ser aceito num grupo
de elite da Marinha Britânica. Ele começou tarde no alpinismo: sua primeira
escalada ao Himalaia aconteceu em 2012, quando já tinha 29 anos. Mas logo se
tornou um alpinista dos mais respeitados.

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Em 2018,
abandonou a Marinha para se dedicar em tempo integral ao “Projeto Possível
14/7”, em que tentaria escalar os 14 picos mais altos do mundo em sete meses,
auxiliado por uma equipe composta exclusivamente por alpinistas nepaleses.

O resultado da expedição é “14 Montanhas, 8 Mil Metros e 7 Meses”, que acaba de estrear na Netflix. O filme está listado como “documentário”, mas prefiro chamá-lo de “reality show”, já que abusa de artifícios televisivos como encenação dramática de passagens, cenas obviamente ensaiadas e um clima melodramático um tanto exagerado.

Muitos
“documentários” modernos parecem ter vergonha de simplesmente descrever o
ocorrido, e abusam de elementos que realçam o drama e suspense da história,
mesmo que para isso seja necessário criar subtramas. No caso de “14 Montanhas”,
o diretor Torquil Jones inventou uma trama paralela em que a mãe de Nirmal, que
está doente, tenta sobreviver para assistir ao triunfo do filho. E tome cenas
lamurientas em hospitais, Nirmal chorando com a irmã, e a inevitável música triunfal
no fim, quando a mãe chora abraçada ao filho. Só faltou o Gugu Liberato
entregando uma coroa de flores.

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Será que o público contemporâneo é incapaz de apreciar uma história simplesmente pelo que ela é? Um homem que escala os 14 picos mais altos do mundo em pouco mais de seis meses não é um tema suficientemente rico? Precisamos mesmo desses estímulos melodramáticos?

O resultado, em tantos “documentários” recentes, é que não sabemos mais onde termina o fato e começa a ficção. Uma pena. Nirmal Purja merecia um filme melhor. Como “Free Solo”, por exemplo.

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