Athletico
Direto do Uruguai

Terans cansou de levar “patadas”, ouviu o pai e quer ser rei no Athletico; veja a história do meia

Por
Fernando Rudnick
19/11/2021 19:08 - Atualizado: 04/10/2023 17:12
Família de David Terans, na torcida pelo Athletico
Família de David Terans, na torcida pelo Athletico | Foto: Albari Rosa/Foto Digital/UmDois Esportes

Certa vez, quando tinha apenas quatro anos de idade, David Terans voltou chorando para casa, no bairro Jardines del Hipódromo, na periferia de Montevidéu. Habilidoso, porém franzino, ele estava cansado de levar patadas nas partidas que disputava nos inúmeros campinhos da região.

O botija, como os uruguaios costumam chamar os meninos, disse ao pai que não queria mais saber de bola. Decisão que durou apenas algum tempo.

“Ele me pediu para levá-lo jogar de novo e eu lhe disse: se lhe acertarem e você voltar para casa chorando, nunca mais vai jogar futebol, pode esquecer”, lembra Rodolfo Lima Terans, 62 anos, pai do meia-atacante do Athletico.

O filho nunca mais chorou, por mais que ainda apanhasse dos marcadores. A lição paterna de que é preciso ter coragem e determinação para enfrentar os desafios foi bem compreendida.

*Fotos do repórter fotográfico Albari Rosa, enviado especial a Montevidéu

O craque uruguaio, então, decidiu que seria jogador profissional. Encontrou novos obstáculos, mas seguiu firme na jornada que pode transformá-lo em campeão da Sul-Americana neste sábado (20), a meros 8,4 km de casa, aos 27 anos de idade.

Com Terans, o Furacão encara o Red Bull Bragantino às 17h, no lendário Estádio Centenário, na grande final do torneio continental.

Origem humilde e ajuda da irmã

Foto: Albari Rosa/Foto Digital/UmDois Esportes
Foto: Albari Rosa/Foto Digital/UmDois Esportes

Miguel David Terans Pérez tem dois gols no campo da final da Copa do Mundo de 1930, palco de Athletico x Bragantino. Ambos marcados com a perna canhota, que não foi lapidada somente nos campos de terra batida perto de casa. O toque especial veio do treino diário com a irmã mais velha, Yarol.

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“Praticamente ela que o ensinou a jogar, a bater na bola”, conta o patriarca. “Eu trabalhava todo o dia, sou militar aposentado. Quem estava com ele era Yarol, que adora futebol e tinha talento também. Se tivesse [futebol feminino no Uruguai] no tempo dela, poderia ter sido jogadora”, acrescenta.

Quando Terans já era um pouco maior, o próprio Rodolfo o levava para os treinos. Normalmente de moto ou em uma castigada caminhonete Chevrolet 1951, que também era usada nas incursões de pai e filho para vender sacos de batata pelos bairros próximos para complementar a renda.

Só que no Nacional, time do coração do pai, a origem humilde da família causou um incômodo. O futuro jogador não quis permanecer no clube após cansar de ser ridicularizado pelos colegas por sua condição social.

“Ele disse que não queria mais ficar lá e não ficou. Foi pro Rentistas”, explica Rodolfo, que aponta a determinação como a principal qualidade do filho. “Ele sempre foi assim. Persegue tudo o que quer até conseguir”.

O início

Em 2013, o experiente técnico Adolfo Barán chegou ao Rentistas com a missão de reformular o elenco, priorizando jogadores das canteras do Rojo, além de conseguir o acesso na Primera B, a segunda divisão uruguaia.

O clube, comumente associado à transações nebulosas, vivia péssimo momento e a esperança era descobrir potencial na base. Barán, então, recebeu a indicação para observar mais de perto uma dessas apostas.

“Me deram o nome de um jogador – e não era David Terans”, recorda.

“Se chamava Paulo Silva, que também jogava bem. Mas depois notei David nos treinos dos juvenis, com aquela perna esquerda, habilidoso, rápido. Gostei e o incorporei ao elenco principal para usar essas armas a nosso favor”, emenda.

Terans estreou ainda adolescente, aos 18 anos. Apesar da pouca experiência, já contribua decisivamente para equipe. No duelo que valeu o acesso, contra o Miramar, marcou dois gols no triunfo por 3 a 0.

Na temporada seguinte, anotou outros sete e ajudou o Rentistas a conseguir uma inédita vaga para a Copa Sul-Americana. Uma evolução rápida.

“Ele era comprometido e ouvia o que falávamos. Sempre foi aberto para treinar, para melhorar. E também praticava muita bola parada após o treino. Sempre teve uma batida especial”, confessa o primeiro treinador.

Aos 22 anos, o meia-atacante trocou de ares pela primeira vez. Foi emprestado ao Santiago Wanderers, do Chile, onde balançou a rede seis vezes em 23 partidas.

O retorno, no ano seguinte, foi literalmente uma volta para casa. Terans, criado a seis quadras do Estádio Jardines del Hipódromo, jogaria por seu clube do coração, o Danubio.

"Para mim, ele foi a melhor contratação da última década do Danubio, com certeza. Quiçá dos últimos 15 anos”, crava o ex-meio-campista Carlos Grossmüller.

“A forma com que ele rendeu – a quantidade de partidas que fez e a quantidade de gols que marcou – me surpreendeu”, acrescenta o uruguaio com passagens pelo Schalke 04, da Alemanha, e Lecce, da Itália.

Os números realmente chamam atenção. Em um ano e meio, entre 2017 e 2018, foram 36 apresentações e 22 gols.

Assim como Barán, Grossmüller também destaca a maneira distinta com que Terans bate na bola. A patada com o pé canhoto, no entanto, chamou tanta atenção quanto seu jeito fora de campo.

“No início, era muito raro ele jogar cartas na concentração com os outros. Terminava de comer e ia para o quarto ver Netflix”, fala. “Depois ele foi se abrindo e, à medida em que o tempo foi passando, ficamos muito próximos”.

Chance no Galo

Do Danubio, Terans partiu para sua segunda empreitada internacional. Desta vez, ao invés de transferir-se para um time periférico de um mercado pouco relevante, encarou logo um gigante: o Atlético-MG.

Aos 24 anos, era comprado por R$ 6 milhões. A aposta, contudo, não correspondeu à expectativa.

“Eu penso que não souberam esperar e não deram as oportunidades que ele merecia”, avalia o empresário Flavio Perchman.

O uruguaio fez apenas onze partidas como titular após desembarcar em Belo Horizonte, em julho de 2018. Vestiu a camisa do Galo por 1249 minutos, em 33 oportunidades.

Ou seja, ficava em campo, em média, por apenas 38 minutos. Na passagem por Minas, que durou até dezembro de 2019, anotou dois gols e uma assistência. “No Galo ele era um ponta mesmo, acompanhava o lateral até o fim, esse tipo de coisa”, lembra o meia Bruninho, cria do time mineiro, atualmente no Juventude.

“O sucesso do Terans hoje não me surpreende. Ele é muito bom jogador, ainda mais atuando da forma certa”, enfatiza o jogador, que criou um vínculo de amizade com o estrangeiro.

“Falei rápido com ele [quando jogamos contra pelo Brasileirão]. Ele me disse que estava muito feliz no Athletico, morando em Curitiba, se sentindo muito bem, acolhido. Acho que é isso que o jogador precisa”.

Amadurecimento

A dificuldade de adaptação ao futebol brasileiro colocou Terans de volta em um avião para Montevidéu. O destino final, contudo, foi o Peñarol, onde teve minutagem, recuperou a confiança e o instinto goleador.

“É verdade que houve um processo de amadurecimento [nesse período] e chegar a um grande clube como Peñarol o ajudou a terminar sua formação como atleta e a amadurecer”, reconhece seu agente.

Em 17 meses de empréstimo, Terans virou ídolo dos carboneros. Com gols em abundância, tornou-se Rey David. Foram 15 bolas na rede em 37 apresentações, desempenho que despertou interesse do Furacão. Em maio deste ano, El Paranaense desembolsou R$ 7,5 milhões para contratar seu camisa 80.

Dois anos depois, a chance de retornar ao Brasil virou um desafio pessoal. “Foi uma aposta grande. Ele estava muito bem no Peñarol, mas era uma revanche no Brasil, ele queria a oportunidade que não lhe deram no Mineiro”, cita Perchman.

O resultado veio imediatamente. Com dois passes para gol nos dois primeiros jogos, Terans deixou seu cartão de visita. Desde maio, já defendeu o Rubro-Negro em 39 duelos (31 como titular), com nove gols e nove assistências.

Dois deles, aliás, contra o Peñarol, equipe que defendeu na primeira fase da Sul-Americana. No Estádio Campeón del Siglo, aliás, marcou com uma meia bicicleta.

“Ele casou bem no Athletico. O David me conta que o elenco é mais companheiro, e aí ele se adaptou muito mais rápido ao jogo”, aponta o pai.

Pés no chão

Ao contrário das três irmãs, Terans sempre foi introspectivo, calado. Característica que talvez o ajudou a não se deslumbrar com o dinheiro e a fama do futebol profissional.

“É um botija muito sensível, que tem princípios muito bons. Ele tem uma maneira de ser e não vai mudar”, garante Barán, que mantém contato até hoje com o pupilo.

A família Terans vive no mesmo local há 27 anos, exatamente a mesma casa em que o atacante foi criado. Como os pais não querem deixar as redondezas, o filho comprou sua casa a duas quadras dali.

“É alguém muito humilde, de boa família, um menino muito bom e que merece tudo que está passando”, elogia Grossmüller.

“É um jogador muito centrado, com os objetivos claros. E também muito da família”, concorda Perchman.

A mãe, Janet, enche os olhos de lágrimas de alegria ao falar sobre o filho. “É um orgulho tão grande, até me faltam palavras”, diz ela, que estará na arquibancada torcendo neste sábado, ao lado de diversos familiares.

Rodolfo tem certeza do título do Furacão, mas prefere não apostar em um gol do filho. “O que eu sei é que ele vai deixar tudo dentro de campo”, finaliza.

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