Relendo as fichas dos jogos, comparando as estatísticas do ano, e participando da reunião dos caras para comemorar o título, percebi que aquele time de 2001 confirma dois clichês muito usados no futebol, quase sempre de forma mentirosa, quais sejam:
“Não existem titulares nem reservas”
Em geral, existem sim. Todo mundo sabe quem é quem e geralmente o ambiente fica uma bosta por causa disso. No caso daquele time, não era bem assim, e os números comprovam.
Todos os jogadores foram usados pelo menos uma vez num tempo de apenas três substituições regulamentares.
14 jogadores diferentes marcaram gols, alguns definindo vitórias importantes.
O vice-artilheiro foi o craque Souza, mas na foto do título está Adriano. Ilan sempre que entrou decidiu, inclusive abrindo o caminha do título na final com o São Caetano. Adauto garantiu pontos fundamentais contra os Botafogo do Rio, São Paulo, América-MG, Bahia e Internacional. Até o jovem Dagoberto teve seus minutos nas partidas finais.
Na zaga, o trio se desfazia muito por causa de suspensões e cartões, mas Igor e Daniel jogavam naturalmente no 3-5-2. “Eu joguei 70% dos jogos”, lembra o bom e discreto volante Pires, que entrava quase sempre para garantir uma vitória.
“Nosso grupo é uma família”
Geralmente, esse papo é furadíssimo. O futebol é ninho de cobras vaidosas. Quem ganha menos, quase nunca ama de verdade os que ganham mais. Quem não joga, torce muitas vezes para o titular ser expulso e por aí vai.
No caso daquele time, em especial, parece que não era assim mesmo.
Talvez o consórcio recreativo da Casa do Dindo e a cobrança pública que o grupo levou os tenha unido a ponto de nos momentos finais o pessoal preferir se fechar no CT do Caju.
O título tornou a amizade indissolúvel a ponto de quase todos renovarem com o Athletico em 2002, em condições até menos favoráveis que outras propostas. Parecia mesmo um crime desfazer aquele grupo.
Com o passar do tempo, pelo menos dez jogadores se mudaram para Curitiba. Muitos trabalharam ou ainda trabalham no clube. Cocito foi de ônibus ver a final da Sul-Americana, vencida pelo Furacão, em Montevidéu.
Os caras mantêm um grupo de WhatsApp, uma quadra para peladas e um espaço para churrascos em conjunto e, quando resolveram comemorar o título, quase todos vieram de todos os cantos do Brasil. Na festa (foto abaixo), pareciam um grupo de colegiais numa viagem para a praia.
“É até emocionante falar. Estou no futebol há 30 anos e até hoje nunca vi outra equipe como foi esse Athletico de 2001, nunca vi e nunca vou ver. Lógico que cada um tem seu grupo, mas igual a nós não! A preocupação que cada um tem dentro e fora de campo, da maneira de se cobrar, de cobrar o companheiro, se hoje a gente está aqui é porque a gente cobrava para o lado bom! É um grupo fantástico, isso ninguém vai apagar”, define o ex-lateral Alessandro.
Um dos líderes do time dentro e fora do campo, o ex-volante Cocito destaca um o vestiário fantástico e faz questão de ressaltar que o papel de Geninho na gestão do elenco.
“Futebol é mais do que só tática, é gestão de pessoas, de relacionamento. Aquele cara que não está jogando, que não joga há dez partidas, vai decidir no final. O Ilan fez o nosso gol na final. Se ele estivesse lá, cabisbaixo, com uma energia negativa será que ele faria o gol? Então é deixar todos em ponto de bala com o pézinho calibrado. Ele falava para os caras ficarem na pontinha dos pés, deixava todo mundo se sentindo importante, o que o ser humano quer hoje em dia é isso, ele quer ser ouvido, essa é a sacada, como as pessoas vão gerir isso. A tática é um mero detalhe”, sentencia o ex-volante.
“Futebol é mais do que só tática, é gestão de pessoas, de relacionamento”
Cocito
Sandro Moser é jornalista, escritor, autor da biografia “Sicupira – Vida e gols de um craque chamado Barcímio”. Convidado pelo UmDois Esportes, o atleticano encarou o desafio de recontar a odisseia atleticana que completa 20 anos.